“ O ambientalismo […] vê a humanidade como uma espécie biológica estritamente dependente do mundo natural […] Muitos dos recursos naturais da Terra estão em vias de exaustão, a química da sua atmosfera está a deteriorar-se e as populações humanas já cresceram de forma excessivamente perigosa. Os ecossistemas naturais, as nascentes de uma ambiente saudável, estão a ser irreversivelmente degradados […] Sou suficientemente radical para levar a sério a questão ouvida cada vez com mais frequência: A humanidade é suicida?” (Edward O. Wilson, “Is Humanity Suicidal?”, New York Times Magazine, 30 de Maio de 1993, p.27).
O Rio Tejo é um rio internacional, com um percurso superior a mil quilómetros, que atravessa não só Espanha (onde se dá o inicio da degradação das suas águas) como atravessa ou ladeia cerca de 30 municípios ribeirinhos, entre os quais o Seixal, que se localiza no Estuário do Tejo.
O Concelho do Seixal foi criado a 6 de Novembro de 1836, em que as suas principais povoações – Corroios, Amora, Torre da Marinha, Paio Pires - se desenvolveram à beira do Rio Tejo. Por este Concelho se situar num local privilegiado, onde o rio entra pela terra dentro, formando um conjunto de esteiros, desenvolveram-se várias actividades relacionadas com a vida fluvial e marítima, como a pesca, a exploração das marinhas de sal, a construção naval, os transportes fluviais e o aproveitamento da energia das marés.
Uma das actividades económicas que aqui se desenvolveu bastante foi a apanha de marisco, nomeadamente a apanha de ostras. “Em 1866 uma casa francesa mandava aqui apanhar grandes quantidades que se destinavam à exportação e em 1894 a companhia “The Anglo Portuguese Cyster Company” explorava as ostreiras do Concelho. Em 1961, foi fundada a Expor – Sociedade de Exploração de Ostras Portuguesas, com sede e expedição na Vila do Seixal. Esta firma explorava as concessões doas bancos ostreílocas, numa área superior a 100 hectares, na Ponta dos Corvos, na Azinheira e dentro do Rio Judeu.
Esta empresa, entre 1962 e 1967, exportou anualmente uma média de 400 toneladas de ostras, para vários pontos do globo, mas principalmente para França. Empregava os designados mariscadores, sobretudo mulheres e jovens, que em rancho apanhavam as ostras. Na semana santa, faziam-se grandes festas nas praias do Seixal (Ponta do Mato), onde o povo comia ostras ao natural, abertas em chapas colocadas sobre fogueiras acesas para esse fim.
Os bancos de ostras não se limitavam ao Concelho do Seixal, estendiam-se por toda a margem sul, desde o Alfeite até Alcochete, incluindo o Barreiro, Moita e Montijo. Na totalidade, os bancos de ostras do Tejo ocupavam uma área muito próxima de um milhar de hectares. Existiam no Tejo, no ano de 1960, 120 empresas concessionadas, enquanto que em 1972 existiam apenas 8.” (LIMA, M. 1992).
Entre 1950 e 1970 registaram-se vários factores que contribuíram para a degradação do Estuário do Tejo, desde o grande desenvolvimento urbano à sua volta até à fixação de indústrias altamente poluentes.
O desenvolvimento urbano trouxe como consequência para o Estuário o aumento excessivo da poluição orgânica, com altos valores de contaminação bacteriológica, tornando estes locais impróprios para qualquer prática balnear ou até mesmo para o desporto náutico.
Em relação à instalação de vários ramos da indústria pesada, em redor do Mar da Palha, pode-se destacar três grandes industrias, o Complexo do Barreiro (CUF, hoje Quimigal) que libertava diversos metais pesados (mercúrio, arsénio, zinco, cobre, cádmio, ferro e chumbo), a Siderurgia Nacional e a Lisnave, que contribuíram em grande parte para a degradação da área de estuário compreendida pelos Concelhos do Seixal, Almada e Barreiro.
A Lisnave deve de ser a indústria que mais contribuiu para o desaparecimento da ostra portuguesa, uma vez que na reparação naval, eram utilizadas tintas TBT nos cascos das embarcações que tinham como objectivo o impedimento da incrustação de gastrópodes no casco. O uso deste tipo de tintas, que é altamente tóxico para os bivalves, provocando anomalias na calcificação, perturbações na embriogénese e no crescimento larvar e juvenil e origina alterações hormonais, provocando o aparecimento de um falso pénis nas fêmeas.
Devido a estes factores todos conjugados, os bancos de ostras ficaram praticamente reduzidos a zero na década de oitenta.
“Se no passado muitas foram as famílias do Concelho do Seixal que viveram da exploração do marisco, desde a apanha da ostra que se destinava à exportação e ao consumo interno, passando por todos os outros bivalves, que eram levados para o mercado da Ribeira, em Lisboa, hoje em dia é pouco significativa a sua captura, muitas vezes proibida devido à má sanidade das águas do rio.” (LIMA, M. 1992)
Análise Económica
Ao se efectuar uma primeira análise ao problema ambiental, verifica-se que se está presente de uma externalidade negativa – poluição industrial e doméstica. Ou seja, a indústria e o crescimento populacional, resultaram num aumento do nível de poluição no Estuário do Tejo, existindo um efeito prejudicial, mas não intencional, na qualidade da água do estuário. Como consequência da poluição, deu-se a extinção da ostra portuguesa, e consequentemente, de todas as empresas que tinham como actividade económica a exploração dos bancos de ostras.
Ao se efectuar uma primeira análise ao problema ambiental, verifica-se que se está presente de uma externalidade negativa – poluição industrial e doméstica. Ou seja, a indústria e o crescimento populacional, resultaram num aumento do nível de poluição no Estuário do Tejo, existindo um efeito prejudicial, mas não intencional, na qualidade da água do estuário. Como consequência da poluição, deu-se a extinção da ostra portuguesa, e consequentemente, de todas as empresas que tinham como actividade económica a exploração dos bancos de ostras.
Como este desaparecimento não foi pago por nenhum dos produtores da poluição, está-se perante uma deseconomia externa. Identificada a externalidade negativa, surgem uma série de questões em volta, ou seja, no passado o que se deveria ter feito para controlar a externalidade, para afectar os responsáveis para atingir a melhor decisão económica, que intervenções deveriam ter sido feitas, e que instrumentos de política do Ambiente poderiam ter sido aplicados.
Em geral, para controlar a poluição, os economistas procuram determinar o nível eficiente de poluição no equilíbrio dos custos e benefícios sociais, mais concretamente, na igualdade entre o beneficio social marginal da despoluição e o custo social marginal da despoluição, (SAMUELSON, 1999).
Os controlos directos, que foram utilizados no problema da poluição do Estuário do Tejo, consistem nos critérios de Qualidade Ambiental, e nos critérios de Saúde Pública.
Em relação às indústrias, nomeadamente à Lisnave, foi imposto pela Comissão Europeia (CE) a proibição do uso de tintas TBT em navios dos países membros. Esta medida foi bastante contestada por prejudicar financeiramente os estaleiros europeus de reparação naval, uma vez que só a partir de 2008 é que todos os navios que entrem no espaço comunitário, é exigido o uso de tintas “amigas do ambiente”, além de que o preço destas novas tintas tende ser mais elevado.Com esta decisão, os estaleiros navais temem perder encomendas para os países orientais, onde não são abrangidos por esta norma. Esta medida adoptada pela CE, foi uma politica que “obrigou” os estaleiros navais (inclusive a Lisnave) a reduzir a emissão de poluentes nocivos à vida marinha, ou seja, “obrigou” as empresas a aumentar os seus custos marginais da remoção da poluição, diminuindo o uso de tintas poluentes – aumento dos benefícios marginais da remoção da poluição. Ao impor esta norma, a CE, pretendeu controlar a externalidade, através de uma análise custo benefício.
De um modo semelhante, foi imposto também pela CE, que todas as indústrias e todos os Municípios deveriam de ter os seus efluentes residuais tratados antes de serem descarregados no rio, de modo a reduzir a poluição. Neste caso, existem programas de apoio à construção das infra-estruturas responsáveis por estes tratamentos (ETAR e ETARI) embora exista sempre um aumento dos custos associados à implementação destas tecnologias por parte da empresa/município.
Os programas governamentais antipoluição têm os seus resultados a médio/longo prazo, e neste caso, quando foram implementados já os bancos de ostras se encontravam extintos.
Embora já se verifique uma melhoria da qualidade da água no estuário, a introdução da ostra no seu habitat tem tido resultados negativos, uma vez que os níveis de poluição ainda são elevados. Muitas indústrias e municípios ainda não têm os seus efluentes tratados, o que acima de tudo constitui um perigo para a Saúde Pública, se considerarmos que a população das zonas ribeirinhas continuam a ter os mesmos hábitos de alguns anos atrás: a apanha de bivalves e a utilização das praias fluviais para fins de lazer e recreativos continuam a ser uma realidade.
Excerto de uma reportagem de Gonçalo Bofill
2005-06-11
Ao ser informado que, nas marés mais baixas, um grande número de pessoas se dirigia para a praia do Clube Naval a fim de apanhar lingueirão, situação que apontava ainda para a venda destes bivalves, de forma clandestina, em restaurantes, o delegado de Saúde decidiu intervir.
2005-06-11
Ao ser informado que, nas marés mais baixas, um grande número de pessoas se dirigia para a praia do Clube Naval a fim de apanhar lingueirão, situação que apontava ainda para a venda destes bivalves, de forma clandestina, em restaurantes, o delegado de Saúde decidiu intervir.
Segundo Mário Durval, esta prática, para além de ilegal, “fere regras básicas para a defesa da saúde das populações”, dado que a praia do Clube Naval encontra-se interdita para fins de uso balnear por excesso de microorganismos de origem fecal. “Naturalmente a utilização para fins alimentares implica uma restrição ainda maior quanto à quantidade de microorganismos”, sublinha.
Mas existem outras condicionantes que levam a que esta apanha seja considerada de “grave risco para a saúde pública”, pois de acordo com o despacho n.º 13433/2003 publicado no D.R. II série N.º 156 de 9 de Julho, todas as zonas de apanha/cultivo no estuário do Tejo pertencem à classe sanitária C, considerada como sendo a pior do ponto de vista sanitário.
Mário Durval salienta que os bivalves provenientes das zonas com estatuto sanitário C não podem ser comercializados para consumo humano directo. “Para tal necessitariam de uma depuração longa, cuja definição ainda não foi efectuada, pelo que o IPIMAR, apenas aconselha às estações depuradoras a utilização de produtos provenientes de zonas com, pelo menos, estatuto sanitário B”.
Mário Durval salienta que os bivalves provenientes das zonas com estatuto sanitário C não podem ser comercializados para consumo humano directo. “Para tal necessitariam de uma depuração longa, cuja definição ainda não foi efectuada, pelo que o IPIMAR, apenas aconselha às estações depuradoras a utilização de produtos provenientes de zonas com, pelo menos, estatuto sanitário B”.
Os bivalves provenientes do estuário do Tejo têm apresentado, ainda, em muitas situações, um teor de chumbo que viola o limite estabelecido no regulamento CE n.º 221/2002 da Comissão de 6 de Fevereiro de 2002.
Importa ainda referir que estes bivalves, após a apanha, não têm qualquer controlo sanitário.
Face a toda esta situação, o delegado de Saúde do Barreiro decidiu interditar a apanha de bivalves na Praia do Clube Naval e solicitar à Polícia Marítima que nas referidas situações de maré faça cumprir aquela determinação, pedindo também à Câmara Municipal do Barreiro a colocação de painéis informativos desta determinação, junto à praia e que elabora um plano de vigilância.
Com estas medidas, Mário Durval espera que esta prática pare, acrescentando que outras acções irão ser tomadas, nomeadamente a vigilância e controlo feitos nos mercados e estabelecimentos que comercializem estes bivalves.
O delegado de Saúde do Barreiro referiu ainda que todos os outros responsáveis pela saúde pública dos concelhos limítrofes serão alertados para esta situação.
Bibliografia:
LIMA, M. (1992), Bivalves e Gastrópodes das praias do Seixal, CMS.
Silva, E. (1981) História do Concelho do Seixal, CMS
SAMUELSON, P.; NORDHAUS, (1999), Economia, 16ª Edição McGraww-Hill
KOLSTAD, C. (2000), Environmental Economics, Oxford University Press.
LIMA, M. (1992), Bivalves e Gastrópodes das praias do Seixal, CMS.
Silva, E. (1981) História do Concelho do Seixal, CMS
SAMUELSON, P.; NORDHAUS, (1999), Economia, 16ª Edição McGraww-Hill
KOLSTAD, C. (2000), Environmental Economics, Oxford University Press.